PENSÃO ALIMENTÍCIA

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EFEITOS DO COVID-19 NA PRISÃO DO DEVEDOR DE ALIMENTOS

A pandemia do novo covid-19 tem forçado o isolamento social e reduzido a atividade econômica dos países, e, por isso, está impactando a atividade empresarial e a economia mundial.

As mudanças no mercado fizeram com que muitos empregadores tomassem medidas drásticas em relação aos estabelecimentos e aos funcionários. Visando evitar a demissão em massa, muitos empregadores optaram por implementar medidas mais brandas e paliativas como a concessão de férias, redução do salário e carga horária proporcional, entre outros.

O impacto econômico, naturalmente, não gera efeitos apenas no mercado, mas nas economias pessoais e, portanto, no núcleo familiar de cada um.

A pensão alimentícia está incluída entre as contas e boletos de muitos e, consequentemente, está sendo afetada pela crise financeira. A extensão dos efeitos da medida liminar a todo o território nacional para conter a disseminação do covid-19, certamente continuará trazendo o aumento da inadimplência de pensões alimentícias.

Tendo em vista que a dívida advinda do não pagamento de pensão alimentícia é a única capaz de gerar a prisão do devedor, como fica a questão diante deste novo cenário?

Antes de tudo, importante ressaltar que, estando os genitores em situação de desemprego ou com remuneração reduzida, o ideal é sempre buscar um meio de amenizar os danos aos filhos.

A jurisprudência dominante do STJ é no sentido de que o desemprego não é requisito para inadimplemento da pensão alimentícia. Da mesma forma, as medidas preventivas em relação ao Corona Vírus não devem ser motivo para a isenção do pagamento da pensão. Assim, a obrigação de contribuir com o sustento do filho não acaba com o desemprego do genitor, podendo, é claro, ser ajustada às novas circunstâncias.

O funcionamento reduzido das agências bancárias, por óbvio, também não poderá servir como justificativa para a ausência de pagamento, uma vez que a tecnologia permite o pagamento via transferência bancária e, inclusive, os caixas eletrônicos continuam funcionando normalmente.

O alimentante, portanto, deve continuar cumprindo com suas obrigações de pagar alimentos ao alimentado, que, por sua vez, continuará a gerar as mesmas despesas com plano de saúde, escola, alimentos, entre outros gastos essenciais para sua subsistência.

Em contrapartida, é preciso considerar o momento atual da sociedade para buscar uma via de resolução de conflitos razoável e equilibrada.

A prisão civil para o devedor de alimentos seria uma opção viável neste cenário?

Dois posicionamentos se abrem em decorrência deste questionamento. O direito dos credores de alimentos, geralmente crianças, em face do perigo potencial em relação aos encarcerados.

A manutenção da prisão em regime fechado colocaria em risco a vida dos devedores de alimentos, dadas as condições das unidades prisionais. É sabido que as prisões brasileiras apresentam cenário de superlotação, insalubridade e pouca ventilação, impedindo o isolamento eficaz necessário para a contenção do vírus.

Contudo, ao se permitir a prisão domiciliar como alternativa, temos, por consequência, a seguinte questão: Se o devedor não tiver o pagamento da pensão vinculado ao desconto em folha, não tiver patrimônio e tiver a decretação da prisão civil domiciliar, este período executado não poderá ser novamente cobrado. De certa forma, seria um incentivo à inadimplência, deixando as mães (na grande maioria) em situação ainda mais vulnerável e sobrecarregadas financeiramente.

Por outro lado, a argumentação favorável à prisão domiciliar é no sentido de que há outros instrumentos para obrigar o pagamento da pensão alimentícia, como a inscrição do devedor no cadastro de inadimplentes, sequestro da CNH (carteira nacional de habilitação) e passaporte, penhora de bens e retenção de 30% do salário.

A situação que o mundo enfrenta é excepcional e, portanto, justifica a tomada de medidas excepcionais. É o que vem ocorrendo nos poderes legislativo e judiciário, que passou a aderir à substituição do regime de cumprimento da prisão, visando proteger o bem estar da coletividade. Vejamos.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) emitiu recomendação aos Tribunais para adoção de medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus – covid-19, no âmbito dos estabelecimentos do sistema prisional e do sistema socioeducativo. Recomendou aos magistrados que considerem a prisão domiciliar das pessoas presas por dívida alimentícia, com vistas à redução dos riscos epidemiológicos e em observância ao contexto local de disseminação do vírus. (art. 6º da recomendação nº 62, de 17 de março de 2020 do CNJ).

Recentemente, em 25 de março, o STJ estendeu a todos os presos por dívida alimentícia os efeitos de uma decisão liminar que garante a prisão domiciliar. A decisão vale para as prisões em andamento e também para as que forem decretadas posteriormente.

Também em 27 de março, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino estendeu a todos os presos por débitos alimentícios do país os efeitos de uma liminar que havia sido dada inicialmente para assegurar a prisão domiciliar no estado do Ceará.

Em seguida, no dia 03 de abril, o Senado aprovou projeto de lei que, entre outros pontos para a contenção do vírus, estabelece o regime domiciliar para os casos de atraso em pensão.

Contudo, por meio da Defensoria Pública de São Paulo, houve informação de que, uma semana após a concessão da liminar e sua respectiva comunicação à Presidência da Seção de Direito Privado do TJSP para conhecimento dos juízes das varas de família, o tribunal estadual ainda não havia tomado as providências necessárias para o seu cumprimento.

Em consequência, o ministro do Superior Tribunal de Justiça Ricardo Villas Bôas Cueva determinou, em 06 de abril, o cumprimento imediato da referida liminar concedida por ele para que as pessoas presas por dívidas alimentícias no estado de São Paulo fossem transferidas para o regime domiciliar.

Importante frisar que a dívida alimentícia permanece, e caberá ao juiz de cada caso estabelecer as condições para o pagamento.

Nos casos em que realmente a renda ficou prejudicada, a melhor alternativa seria o acordo extrajudicial provisório entre as partes considerando cortes em despesas não essenciais ou que estão momentaneamente suspensas, por ordem do poder público.

Outra alternativa é o parcelamento da pensão sem aplicação de juros.

O melhor seria apresentar o acordo em juízo para que haja homologação e, consequentemente, validade jurídica. Todavia, considerando as particularidades do momento, o acordo extrajudicial assinado, ainda que não homologado, poderá, no futuro, servir de prova caso haja questionamento por alguma das partes.

Frisa-se que ingressar com uma ação para pedir os alimentos ou para rever a pensão alimentícia não é a melhor opção no momento, tendo em vista a redução dos serviços e expediente no judiciário, de forma que a delonga no andamento processual pode acabar gerando ainda mais prejuízos.

Assim, diante do cenário exposto, dos posicionamentos contrários e favoráveis à medida em questão, o que se recomenda é a utilização do bom senso e da solidariedade em busca de resoluções pacíficas e equilibradas.

MENEZES ADVOGADOS

Flavio Menezes / Gabriela de Martino

Publicado em 17/04/2020